sexta-feira, 30 de outubro de 2009

CRÔNICAS VATICANAS: O DIÁLOGO ECUMÊNICO CONTINUA

Crônicas Vaticanas: o diálogo ecumênico continua

BENTO XVI: COM PESSOAS HONESTAS, A SOCIEDADE PROGRIDE

Bento XVI: com pessoas honestas, a sociedade progride

quinta-feira, 22 de outubro de 2009

EVANGELHO SEGUNDO S. LUCAS 12,49-53

Comentário ao Evangelho do dia feito por:
Santo Ambrósio (c. 340-397), Bispo de Milão e Doutor da Igreja
Comentário ao evangelho de Lucas, 7, 134 (a partir da trad. cf. SC 52, pp. 55ss.)


«Todo aquele que tiver deixado casas, irmãos, irmãs, pai, mãe, mulher, filhos ou terras por causa do Meu nome, receberá cem vezes mais» (Mt 19, 29)

«Julgais que Eu vim estabelecer a paz na terra? Não, Eu vo-lo digo, mas antes a divisão. Porque, daqui por diante, estarão cinco divididos numa só casa: três contra dois, e dois contra três». Em quase todas as passagens do Evangelho o sentido espiritual joga um papel importante; mas nesta passagem sobretudo, para não ser rejeitada pela dureza de uma interpretação simplista, é preciso procurar na trama do sentido a profundidade espiritual. [...] Como é que Ele próprio disse: «Dou-vos a Minha paz, deixo-vos a Minha paz» (Jo 14, 27), se veio separar os pais dos filhos, os filhos dos pais, rompendo os laços que os unem?
Como pode ser chamado «maldito o que trata com desprezo seu pai ou sua mãe» (Dt 27, 16), e fervoroso o que o abandona? Se compreendermos que a religião vem em primeiro lugar e a piedade filial em segundo, compreenderemos que esta questão se esclarece; com efeito, é preciso fazer passar o humano depois do divino. Porque, se temos deveres para com os pais, quanto mais para com o Pai dos pais, a quem devemos estar reconhecidos pelos nossos pais? [...] Ele não diz, portanto, que é preciso renunciar aos que amamos, mas que há que preferir Deus a todos. Aliás, encontramos noutro livro: «Quem amar pai ou mãe mais do que a Mim não é digno de Mim» (Mt 10, 37). Não te é interdito amares os teus pais, mas preferi-los a Deus. Porque as relações naturais são benefícios do Senhor, e ninguém deve amar os benefícios recebidos mais do que a Deus, que preserva os benefícios que dá.

A COEXISTÊNCIA DAS RELIGIÕES NA ÁFRICA

A África é um cúmulo de realidades muito diversificadas entre elas, também do ponto de vista religioso. Por isso, afirma o cardeal Jean-Louis Tauran, presidente do Pontifício Conselho para o diálogo inter-religioso, o continente africano é um importante laboratório de diálogo com os muçulmanos. De um diálogo, porém, fundado sobre o viver juntos.
No que se refere à fé católica, o Sínodo chamou a atenção, deste o primeiro dia, sobre o forte crescimento das comunidades cristãs. O cardeal Tauran encontrou na religiosidade natural dos africanos uma das razões desta vitalidade.
A fé está, portanto, progressivamente se difundindo em toda a África, chegando a penetrar nas culturas locais. Uma inculturação, explica o cardeal francês, que prossegue de modo espontâneo.
“Há uma grande variedade e é evidente que o Islã é vivido de modo diferente segundo os países. Mas no conjunto, no que se refere ao islã na África, pode-se dizer que apesar de tudo o diálogo de vida é uma realidade. No conjunto, o islã é tolerante, com algumas exceções, como por exemplo a Nigéria”.
“Os africanos são dotados de uma religiosidade toda natural. Não se deve esquecer que quando chegaram aqui os cristãos e mais tarde os muçulmanos encontraram populações que acreditavam em um ser supremo, com base na religião tradicional africana. Portanto, existia já um terreno favorável... os missionários não levaram Deus, mas sim Jesus Cristo”. “Creio que devem ser dados ainda muitos passos avante. Mas quando se olha para as liturgias na África, não são poucos os progressos feitos. Em particular se se olha para as procissões, cantos... pouco a pouco se chegou a ter um cristianismo africano, aberto à Igreja em todo o mundo, muito respeitável”.

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

EVANGELHO SEGUNDO S. LUCAS 12,13-21

Comentário ao Evangelho do dia feito por:
São Basílio (c. 330-379), monge e bispo de Cesaréia, na Capadócia, Doutor da Igreja
Homília 6, sobre a riqueza; PG 31, 261ss. (a partir da trad. Luc comentado, DDB 1987, p. 110 rev.)


«Que hei-de fazer, uma vez que não tenho onde guardar a minha colheita?»

«Que hei-de fazer?» Há uma resposta imediata: «Satisfarei as almas dos esfomeados; abrirei os meus celeiros e convidarei todos os que passam necessidades. [...] Farei ouvir uma palavra generosa: vós, a quem falta o pão, vinde a mim; tomai a vossa parte, de acordo com as vossas necessidades, dos dons concedidos por Deus que jorram como que de uma fonte pública.» Mas tu, homem rico, insensato, estás bem longe disso! Por que razão? Ciumento de veres os outros gozarem de riquezas, entregas-te a cálculos miseráveis, não te preocupas em distribuir a cada um o indispensável, mas em tudo amealhar, privando os outros dos benefícios de que poderiam usufruir. [...]
E vós, meus irmãos, estai atentos para não conhecerdes o mesmo destino que este homem! Se a Escritura nos oferece este exemplo, é para que evitemos comportar-nos do mesmo modo. Imitai a terra: como ela, dai frutos, e não vos mostreis piores que ela, que no entanto é desprovida de alma. A terra dá as suas colheitas não para o seu próprio gozo, mas para te servir. Assim, todo o fruto da benevolência que revelares, recebê-lo-ás de volta, dado que as graças que fazem nascer as boas obras voltam aos que as dispensam. Alimentaste o que tinha fome, e o que deste mantém-se contigo, e vem mesmo um suplemento. Como o grão de trigo caído na terra aproveita ao que o semeou, o pão dado ao que tem fome far-te-á receber mais tarde benefícios superabundantes. Que a finalidade da tua lavoura seja para ti o início da sementeira no céu.

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

EVANGELHO SEGUNDO S. LUCAS 11,42-46

Comentário ao Evangelho do dia feito por:
As Máximas dos Padres do Deserto (séculos IV e V)
Collection systématique, cap. 9 (a partir da trad. de SC 387, pp. 427ss.)


«Ai de vós, também, doutores da Lei, porque carregais os homens com fardos insuportáveis»

Um irmão que tinha pecado foi expulso da igreja pelo sacerdote; e o abba Bessarion levantou-se e saiu com ele, dizendo: «Eu também sou pecador» [...]
Certa vez, em Scété, um irmão cometeu uma falta. Convocou-se um conselho para o qual chamaram o abba Moisés, mas este recusou-se a comparecer. Então o padre mandou-lhe dizer: «Vem, porque toda a gente está à tua espera». Ele levantou-se, pegou numa cesta rota, encheu-a de areia, colocou-a aos ombros e foi assim. Os outros, que saíram ao seu encontro, perguntaram-lhe: «Que é isso, pai?» O ancião respondeu: «Os meus pecados vão-se derramando atrás de mim e eu nem consigo vê-los; e, no entanto, vim aqui hoje julgar os pecados de outrem». Ouvindo isto, não disseram nada ao irmão, mas perdoaram-lhe.
O abba Joseph perguntou ao abba Poemen: «Diz-me o que devo fazer para me tornar monge». O ancião respondeu: «Se queres encontrar repouso aqui e no mundo que há-de vir, repete continuamente: «Quem sou eu?» E não julgues ninguém».
Um irmão perguntou ao mesmo abba Poemen: «Se eu vir um pecado do meu irmão, será correto ocultá-lo?» O ancião respondeu-lhe: «Enquanto escondermos os pecados dos nossos irmãos, também Deus esconde os nossos; a partir do momento em que manifestamos as faltas dos irmãos, Deus manifesta também as nossas».

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

BENTO XVI: JESUS NOS CONVIDA AO DOM TOTAL DA VIDA

Bento XVI: Jesus nos convida ao dom total da vida

Shared via AddThis

EVANGELHO SEGUNDO S. LUCAS 11,29-32

Comentário ao Evangelho do dia feito por:

São Gregório de Nissa (c. 335-395), monge e bispo

Homilia sobre o Cântico dos Cânticos (a partir da trad. de Migne 1992, p.40 rev.)

«Aqui está quem é maior do que Salomão!»

O texto do Cântico dos Cânticos de Salomão apresenta a alma como uma noiva, preparada para uma união incorpórea, espiritual e sem mancha com Deus. Aquele que «deseja que todos os homens se salvem e conheçam a verdade» (1Tim 2, 4) expõe assim o meio mais completo, o feliz meio de alcançar a salvação, a saber, aquele que passa pelo amor. Há quem encontre a salvação no temor, evitando fazer o mal pela consideração dos castigos que nos ameaçam na geena. Há também quem leve uma vida de retidão e de virtude porque tem a esperança de receber o salário reservado àqueles que tiveram uma existência piedosa; estes agem, não por amor do bem, mas com a esperança de serem recompensados.

Ora, para avançarmos na perfeição, temos de começar por expulsar da alma o temor; é uma atitude servil não estarmos vinculados ao mestre apenas por amor. [...] Não amamos com todo o coração, com toda a alma e com todas as forças (Mc 12, 30) um dos dons com os quais somos recompensados, mas Aquele que é a própria fonte destes bens. Assim deve ser a alma segundo a palavra de Salomão. [...]

Julgas que evoco o Salomão, o filho de Bersabé, que no alto da montanha sacrificou mil bois e que, a conselho de sua mulher estrangeira, cometeu um pecado? Não. Estou a pensar noutro Salomão, naquele que também nasceu de David segundo a carne, e que tem por nome «paz», pois o nome de Salomão significa «homem de paz». Esse é o verdadeiro Rei de Israel, o construtor do Templo de Deus, o detentor do conhecimento universal, Aquele cuja sabedoria é incomensurável - mais ainda, que é por essência sabedoria e verdade, cujo nome e cujo pensamento são perfeitamente divinos e sublimes. Ele serviu-Se de Salomão como de um instrumento; é Ele que, através da voz de Salomão, Se dirige a nós, primeiro nos Provérbios, depois no Eclesiastes, e depois no Cântico dos Cânticos, apresentando assim à nossa reflexão, com ordem e método, a forma de progredir com vista à perfeição.

terça-feira, 6 de outubro de 2009

REFLEXÃO DO PAPA: RECONCILIAÇÃO, DOM DO ESPÍRITO

Primeira Congregação Geral, manhã de 5 de outubro

A seguir a reflexão feita por Bento XVI ontem de manhã na primeira congregação geral da assembléia do Sínodo para a África.

- * -

Queridos irmãos e irmãs

Demos início agora ao nosso encontro sinodal, invocando o Espírito Santo e bem sabendo que neste momento não podemos realizar tudo aquilo que temos a fazer pela Igreja e pelo mundo: só na força do Espírito Santo podemos encontrar o que é reto e depois atuá-lo. E todos os dias começaremos o nosso trabalho invocando o Espírito Santo com a oração da Hora Terceira «Nunc sancte nobis Spiritus». Portanto, neste momento, juntamente convosco, gostaria de meditar um pouco sobre este hino, que abre o trabalho a cada dia, agora no Sínodo, mas também depois na nossa vida quotidiana.

«Nunc sancte nobis Spiritus». Peçamos para que o Pentecostes não seja só um acontecimento do passado, o primeiro início da Igreja, mas seja hoje, aliás agora: «nunc sancte nobis Spiritus». Peçamos que o Senhor realize agora a efusão do seu Espírito e crie novamente a sua Igreja e o mundo. Recordemos que os apóstolos depois da Ascensão não iniciaram - como talvez teria sido normal - a organizar, a criar a Igreja futura. Esperaram a ação de Deus, esperaram o Espírito Santo. Compreenderam que a Igreja não pode ser feita, que não é o produto da nossa organização: a Igreja deve nascer do Espírito Santo. Como o próprio Senhor foi concebido e nasceu do Espírito Santo, assim também a Igreja deve ser sempre concebida e nascer do Espírito Santo. Só com este ato criativo de Deus nós podemos entrar na atividade de Deus, na ação divina e colaborar com Ele. Neste sentido, também todo o nosso trabalho no Sínodo é colaborar com o Espírito Santo, com a força de Deus que nos antecede. E devemos sempre implorar de novo para que se cumpra esta iniciativa divina, na qual nós podemos depois ser colaboradores de Deus e contribuir para que de novo a sua Igreja nasça e cresça.

A segunda estrofe deste hino - «Os, lingua, mens, sensus, vigor, / Confessionem personent: / Flammescat igne caritas, / accendat ardor proximos» - é o coração desta oração. Imploremos a Deus três dons, os dons essenciais do Pentecostes, do Espírito Santo: confessio, caritas, próximos. Confessio: há a língua de fogo que é «racional», doa a palavra justa e faz pensar à superação da Babilônia na festa do Pentecostes. A confusão nascida do egoísmo e da soberba do homem, cujo efeito é não mais poder compreender-se, é superada pela força do Espírito, que une sem uniformizar, que dá unidade na pluralidade: cada um pode entender o outro, inclusive nas diversidades das línguas. Confessio: a palavra, a língua de fogo que o Senhor nos dá, a palavra comum na qual estamos todos unidos, a cidade de Deus, a santa Igreja, na qual toda a riqueza das diversas culturas está presente. Flammescat igne caritas. Esta confissão não é uma teoria mas é vida, é amor. O coração da santa Igreja é o amor, Deus é amor e comunica-se comunicando-nos o amor. E enfim, o próximo. A Igreja nunca é um grupo fechado em si, que vive por si como um dos muitos grupos que existem no mundo, mas se distingue pela universalidade da caridade, da responsabilidade pelo próximo.

Consideremos um por um estes três dons. Confessio: na linguagem da Bíblia e da Igreja antiga esta palavra há dois significados essenciais, que parecem opostos, mas que com efeito constituem uma única realidade. Confessio, antes de tudo, é a confissão dos pecados: reconhecer a nossa culpa e conhecer que diante de Deus somos insuficientes, somos culpados, não estamos na reta relação com Ele. Este é o primeiro ponto: conhecer-se a si mesmo na luz de Deus. Só nesta luz podemos conhecer-nos a nós mesmos, podemos entender inclusive quanto mal existe em nós e assim ver quanto deve ser renovado, transformado. Só na luz de Deus conhecemo-nos uns aos outros e vemos realmente toda a realidade.

Parece-me que devemos considerar tudo isto nas nossas análises sobre a reconciliação, a justiça e a paz. São importantes as análises empíricas, é importante que se conheça exatamente a realidade deste mundo. Contudo, estas análises horizontais, feitas com tanta exatidão e competência, são insuficientes. Não indicam os verdadeiros problemas porque não os colocam à luz de Deus. Se não virmos que na raiz está o Mistério de Deus, as coisas do mundo irão mal porque a relação com Deus não é ordenada. E se a primeira relação, aquela de base, não for correta, todas as outras relações, por mais que possa haver de bem, fundamentalmente não funcionam. Por isso, todas as nossas análises do mundo são insuficientes se não formos até a este ponto, se não considerarmos o mundo na luz de Deus, se não descobrirmos que na raiz das injustiças, da corrupção, está um coração não reto, um fechamento para com Deus e, portanto, uma falsificação da relação essencial que é o fundamento de todas as outras.

Confessio: compreender na luz de Deus as realidades do mundo, a primazia de Deus e, enfim, todo o ser humano e as realidades humanas, que tendem à nossa relação com Deus. E se ela não for correta, não alcança o ponto desejado por Deus, não entra na sua verdade, também todo o resto não é corrigível porque nascem de novo com todos os vícios que destroem a rede social, a paz no mundo.

Confessio: ver a realidade na luz de Deus, entender que no fundo as nossas realidades dependem da nossa relação com o nosso Criador e Redentor, e assim ir à verdade, à verdade que salva. Santo Agostinho, ao referir-se ao 3º capítulo do Evangelho de São João, definiu o ato da confissão cristã como «realizar a verdade, ir à luz». Só vendo na luz de Deus as nossas culpas, a insuficiência da nossa relação com Ele, caminhamos à luz da verdade. E só a verdade salva. Finalmente, atuamos na verdade: confessar realmente nesta profundidade da luz de Deus é realizar a verdade.

Este é o primeiro significado da palavra confessio, confissão dos pecados, reconhecimento da culpabilidade que resulta da nossa falida relação com Deus. Entretanto um segundo significado de confissão é dar graças a Deus, glorificar Deus, testemunhar Deus. Podemos reconhecer a verdade do nosso ser porque tem a resposta divina. Deus não nos deixou sós com os nossos pecados; até quando a nossa relação com a sua majestade está impedida, Ele não se retira mas vem e pega-nos pela mão. Por conseguinte, confessio é testemunho da bondade de Deus, é evangelização. Poderíamos dizer que a segunda dimensão da palavra confessio é idêntica à evangelização. Vemos isto no dia de Pentecostes, quando São Pedro, no seu discurso, por um lado acusa a culpa das pessoas - matastes o santo e o justo - mas ao mesmo tempo, diz: este Santo ressuscitou e ama-vos, abraça-vos, chama-vos para ser seus no arrependimento e no batismo, e também na comunhão do seu Corpo. Na luz de Deus, confessar torna-se necessariamente anunciar Deus, evangelizar e desse modo renovar o mundo.

A palavra confessio, contudo, recorda-nos ainda outro elemento. No capítulo 10 da Carta aos Romanos São Paulo interpreta a confissão do capítulo 30 do Deuteronômio. Neste último texto parece que os judeus, entrando na forma definitiva da aliança, na Terra Santa, tenham medo e não possam realmente responder a Deus como deveriam. O Senhor diz-lhes: não tenhais medo, Deus não está longe. Para alcançar Deus não é necessário atravessar um oceano desconhecido, não são necessárias viagens espaciais no céu, coisas complicadas ou impossíveis. Deus não está distante, não está do outro lado do oceano, nesses espaços imensos do universo. Deus está próximo. Está no teu coração e nos teus lábios, com a palavra da Torah, que entra no teu coração e se anuncia nos teus lábios. Deus está em ti e contigo, está próximo.

Na sua interpretação, São Paulo substitui a palavra Torah pela expressão confissão e fé. Diz: realmente Deus está próximo, não são necessárias expedições complicadas para chegar a Ele, nem aventuras espirituais ou materiais. Deus está próximo com a fé, está no teu coração, e com a confissão está nos teus lábios. Está em ti e contigo. Realmente Jesus Cristo com a sua presença dá-nos a palavra da vida. Assim entra, na fé, no nosso coração. Habita no nosso coração e na confissão levamos a realidade do Senhor ao mundo, a este nosso mundo. Este elemento parece-me muito importante: o Deus próximo. As coisas da ciência, da técnica incluem grandes investimentos: as aventuras espirituais e materiais são custosas e difíceis. Mas Deus doa-se gratuitamente. As maiores coisas desta vida - Deus, amor, verdade - são gratuitas. Deus doa-se no nosso coração. Diria que deveríamos com freqüência meditar esta gratuidade de Deus: não há necessidade de grandes dons materiais ou intelectuais para estar próximo de Deus. Deus doa-se gratuitamente no seu amor, está em mim no coração e nos lábios. Esta é a coragem, a alegria da nossa vida. Também é a coragem presente neste Sínodo, porque Deus não está distante: está conosco com a palavra da fé. Penso que também esta dualidade é importante: a palavra no coração e nos lábios. Esta profundidade da fé pessoal, que realmente me liga intimamente com Deus, em seguida deve ser confessada: fé e confissão, interioridade na comunhão com Deus e testemunho da fé que se exprime nos meus lábios e se torna tão sensível e presente no mundo. São dois aspectos importantes que estão sempre juntos.

Depois o hino sobre o qual estamos falando indica também os lugares nos quais se encontra a confissão: «os, lingua mens, sensus vigor». Todas as nossas capacidades de pensar, falar, sentir, agir, devem ressoar - o latim usa o verbo «personare» - a palavra de Deus. O nosso ser, em todas as suas dimensões, deveria estar repleto desta palavra, que se torna assim realmente sensível no mundo, que, através da nossa existência, ressoa no mundo: a palavra do Espírito Santo.

E depois, brevemente, outros dois dons. A caridade: é importante que o cristianismo não seja uma soma de idéias, uma filosofia, uma teologia, mas um modo de viver, o cristianismo é caridade, é amor. Só assim tornamo-nos cristãos: se a fé se transformar em caridade, se é caridade. Podemos dizer que também logos e caritas caminham juntos. O nosso Deus é, por um lado, logos - razão eterna. Mas esta razão é também amor, não é fria matemática que constrói o universo, não é um demiurgo: esta razão eterna é fogo, é caridade. Em nós mesmos deveria realizar-se esta unidade de razão e caridade, de fé e caridade. E assim transformados na caridade tornar, como dizem os Padres gregos, divinizados. Diria que no desenvolvimento do mundo este percurso é visto como uma subida, desde as primeiras realidades criadas até à criatura homem Mas esta escada ainda não terminou. O homem deveria ser divinizado e assim realizar-se. A unidade da criatura e do Criador: é este o verdadeiro desenvolvimento, alcançar a graça de Deus nesta abertura. A nossa essência é transformada na caridade. Se falamos deste desenvolvimento, pensamos sempre também nesta última meta, onde Deus quer chegar conosco.

Enfim, o próximo. A caridade não é algo individual, mas universal e concreto. Hoje na Missa proclamamos a página evangélica do bom samaritano, na qual vemos a dupla realidade da caridade cristã, que é universal e concreta. Este samaritano encontra um judeu que está além dos confins da sua tribo e da sua religião. Mas a caridade é universal e por isso este estrangeiro em todos os sentidos é para ele o próximo. A universalidade abre os limites que fecham o mundo e criam as diversidades e os conflitos. Ao mesmo tempo, o fato de que se deve fazer algo pela universidade não é filosofia mas ação concreta.

Devemos tender para esta unificação de universalidade e solidez, devemos abrir realmente estes confins entre tribos, etnias, religiões à universalidade do amor de Deus. E isto não só na teoria mas nos lugares de vida, com toda a solidez necessária. Rezemos ao Senhor para que nos doe tudo isto, na força do Espírito Santo. No final o hino é glorificação do Deus Trino e Uno e oração de conhecer e crer. Assim o fim regressa ao início. Rezemos a fim de que possamos conhecer, conhecer se torne crer e crer se torne amar, ação. Peçamos ao Senhor a fim de que o Espírito Santo suscite um novo Pentecostes, nos ajude a ser os seus servidores neste momento do mundo. Amém.

[© Libreria Editrice Vaticana]


Fonte: Agência Zenit – 05/10/2009

FÉ E CIÊNCIA, DIÁLOGO NECESSÁRIO

Colóquio entre Dom Ravasi e o geneticista Axel Kahn

“Excluir a razão ou não admitir nada mais que a razão” são os dois excessos a evitar ao confrontar fé e ciência, afirmou o presidente do Conselho Pontifício para a Cultura, Dom Gianfranco Ravasi, tomando um pensamento do filósofo Pascal.

O prelado falou durante um debate com o geneticista Axel Kahn, presidente da Universidade Paris-Descartes, realizado na sexta-feira passada na embaixada francesa na Santa Sé.

O evento realizou-se por iniciativa da embaixada, em colaboração com a Delegação da Comissão européia na Santa Sé.

Dois excessos que devem substituir-se por “dois olhares, a ciência e a fé”, ambas necessárias “para uma visão completa da realidade que se explora”, disse Dom Ravasi.

Para o arcebispo, a relação entre ciência e fé deve dar-se “na distinção e no diálogo”.

Cada uma delas cobre “âmbitos diferentes, com caminhos autônomos e diferentes metodologias”, mas ambas “têm necessidade uma da outra para se completar na mente de uma pessoa que pensa”, afirmou.

Dom Ravasi disse que “a tentação no Ocidente é, por um lado, burlar-se vendo a teologia como um produto da paleontologia cultural destinado a ser abandonado com o advento da ciência e, por outro, impor à ciência alguns limites fundamentados sobre afirmações teológicas”.

Objetos diferentes

“A ciência –prosseguiu Dom Ravasi– interroga-se sobre o ‘como’, enquanto a metafísica e a religião se dedicam a investigar os valores últimos, o ‘por que’”.

Ainda que certamente a teologia e a ciência têm “gramáticas diversas”, explicou o arcebispo, “também têm coincidências metodológicas e expressivas”.

A linguagem científica moderna, por exemplo, “recorre muito à categoria do símbolo, aproximando-se do teológico”, disse.

Por outro lado, “segundo Santo Agostinho, “a fé não é nada se não se pensa sobre ela”; a adesão da fé não é só afetiva, mas requer uma elaboração intelectual, e a teologia serve-se de categorias lógicas”, continuou.

Dom mesmo modo, se o conhecimento de fé se situa em um canal distinto ao da simples racionalidade, “não é o único deste tipo experimentado pelo homem”, indicou. E explicou: “pode-se pensar na experiência do enamoramento, em que se supera o que a ciência oferece e se vê no rosto do outro a beleza além da objetividade”.

“Trata-se de um conhecimento verdadeiro, ainda que não é o mesmo que o da geometria, o da racionalidade”, afirmou.

Nem tudo é ciência

Por sua parte, o geneticista Kahn questionou: “por que um quadro é belo?”. “Não há uma resposta científica a esta pergunta, mas é legítimo propô-la, assim como perguntar-se se algo está bem ou mal”.

“A filosofia –prosseguiu Kahn– é um método racional para buscar respostas que não podem ser enfrentadas com a ciência e a racionalidade”.

E é a filosofia, em lugar da fé, a que se exige um diálogo com a ciência, opinou Kahn.

“O diálogo deve ter um vocabulário de conceitos comuns – acrescentou: se os conceitos da fé e da ciência são incomensuráveis entre si, o diálogo não pode ser intelectualmente frutífero”.

“O enfoque filosófico-científico pressupõe uma questão aberta à qual se tenta responder: se a hipótese de início, depois da verificação, resultar ser falsa, renuncia-se a ela”.

Em contrapartida, um enfoque teológico “não pode renunciar a sua premissa, que é a Revelação”. No entanto, “o diálogo entre a fé e a ciência é útil”, disse o geneticista.

“Sobre o humanismo, as posições convergem e estamos mais de acordo que em desacordo”, afirmou.

Na pesquisa com embriões, por exemplo, “a necessária proteção da singularidade do embrião – que ao se desenvolver converte-se em um ser humano – deve recordar-se com ou sem fé”, opinou.

“Sobre a condenação dos exames genéticos nos imigrantes, penso como a Igreja francesa”, acrescentou.

Para Kahn, “nosso mundo está fundado sobre os que crêem e os que não crêem, mas é necessário criar o futuro juntos; há que dialogar sobre o que uns e outros consideram o caminho correto”.

“A aparição de um ser humano é o resultado de duas condições: possuir um genoma humano e saber olhar o próximo como um questionamento, alguém através de cujo valor de ser humano percebo meu próprio valor”, afirmou Kahn.

“A reciprocidade – concluiu Kahn, que se professou ‘agnóstico, mas não ateu’ – para um materialista, desde fora da Revelação, é a condição do pensamento moral”.

Dom Ravasi recordou que “quando o Gênesis define a imagem de Deus no homem, afirma que “homem e mulher os criou”, quer dizer, que a imagem de Deus é a relação de amor, a reciprocidade”.

“Para utilizar de novo um pensamento de Pascal”, concluiu o presidente do Conselho Pontifício para a Cultura. “se existe o amor, existe Deus”.

Chiara Santomiero

Fonte: Agência ZENIT - ROMA, terça-feira, 6 de outubro de 2009

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

CRISTIANISMO NÃO É UMA FILOSOFIA, E SIM UM MODO DE VIVER, É AMOR, AFIRMA BENTO XVI

Ao presidir esta manhã a primeira Congregação Geral da Assembléia Especial para a África do Sínodo dos Bispos e perante 226 Padres Sinodais, o Papa Bento XVI assinalou que o Cristianismo "não é uma soma de idéias, uma filosofia, uma teoria. E sim, um modo de viver. É caridade. É amor".

Ao iniciar sua reflexão, informa Rádio Vaticano, o Santo Padre afirmou que "começamos nosso Sínodo invocando o Espírito Santo, pois bem sabemos que nós não podemos fazer o que é necessário fazer pela Igreja e pelo mundo, neste momento. Só na força do Espírito Santo podemos encontrar o que é reto e segui-lo".

Depois de afirmar que o "Espírito divino nos permite conhecer as realidades humanas à luz de Deus", Bento XVI explicou que os limites das análises são aqueles meramente sociológicos. Trata-se, disse o Papa, de análises "horizontais" que carecem da dimensão "vertical".

"Se a primeira relação, aquela fundamental, não é correta, todas as outras relações não funcionam desde o mais profundo. Portanto, toda nossa análise do mundo é insuficiente se não considerarmos o mundo à luz de Deus. Se não descobrirmos que na base das injustiças e da corrupção há um coração que não é reto. Há um fechamento para com Deus e, portanto uma falsificação da relação fundamental sobre a qual aconteceram todas as demais".

Em sua meditação, o Papa refletiu no Hino da Hora Tercia, a oração que introduz a sessão sinodal matutina, e assegurou que é importante reconhecer "a pequenez humana ante Deus. Pequenez da qual se derivam todos os vícios que destroem a rede social e a paz no mundo".

Seguidamente o Papa destacou a grandeza, gratuidade e a cercania do amor de Deus. "As coisas da ciência, da técnica custam grandes investimentos, aventuras espirituais e materiais custosas e difíceis. Mas Deus se dá gratuitamente. As grandes coisas da vida –Deus, o amor e a verdade– são gratuitas e diria que sobre isso devemos meditar freqüentemente. Sobre esta gratuidade de Deus. Sobre o fato que não há necessidade de grandes dons materiais nem intelectuais para estar perto de Deus: Deus está em mim, em meu coração e em meus lábios".

"O homem que descobre a intimidade com o divino deve testemunhá-lo com todo seu ser. Deve testemunhar a verdade da caridade de Deus porque esta é a essência da religião cristã", enfatizou o Santo Padre.

"A caridade de Deus deve ser anunciada à humanidade. A cada homem, que para um cristão é próximo e irmão", precisou.

Bento XVI sublinhou logo que "o cristianismo não é uma soma de idéias, uma filosofia, uma teoria. E sim, modo de viver. É caridade. É amor. Só assim chegamos a ser cristãos: se a fé se transformar em caridade. Se for caridade. Nosso Deus é por uma parte 'Logos' -Razão eterna- mas esta Razão é também Amor. Não é matemática fria que constrói o universo. Esta Razão eterna é fogo. É caridade. Já em nós deveria realizar-se esta unidade de razão e caridade, de fé e caridade".

Evocando ao Bom Samaritano da liturgia de hoje, Bento XVI ressaltou que "a caridade não é uma coisa individual, mas universal. Universal e concreta. Devem-se abrir realmente os limites entre tribos, etnias e religiões à universalidade do amor de Deus em nossos âmbitos de vida, todo o que seja concretamente necessário".

"Roguemos ao Senhor que nos doe o Espírito Santo, que nos dê um novo Pentecostes, que nos ajude a ser seus servidores nesta hora do mundo", concluiu.

Fonte: ACI – 05/10/09